terça-feira, 31 de julho de 2012
Instabilidade e crise financeira por Adriano Moreira
O enfrentamento do tempo da sociedade civil com o tempo dos governos despóticos no quadro da chamada Primavera Árabe não poderia deixar de apelar à revisão do quadro de responsabilidades e capacidades dos Estados ligados ao Mediterrâneo, com especial atenção das soberanias europeias. Estas são chamadas a encarar uma evolução desafiante da paz, que sempre terá efeitos colaterais sérios, num tempo internacional de crise financeira e económica generalizada, em que os equilíbrios orçamentais se impõem a todas as exigências, designadamente constitucionais na área dos direitos abrangidos pela principiologia do Estado social.
Mas esta questão de instabilidade, que é aguda no mar próximo, é uma daquelas contingências que fazem parte das que, embora tendo sido previstas, surpreendem os programas de governo e os seus responsáveis, limitados pelos meios disponíveis e até pela legislação de crise posta em vigor.
Não facilita enfrentar os factos diminuindo a atenção da opinião pública com comentários que depois lhes dão uma forma, e relevo, ao mesmo tempo que as razões de alerta se agravam no mundo próximo, cuja instabilidade crónica tende para se agravar.
O caso da Síria desafia o direito--dever de intervenção, sem dúvidas sobre que já existem factos suficientes para a intervenção da competência do Tribunal Penal Internacional, designadamente sendo visível que o sacrificado Líbano, antigamente ligado à Síria pelo império turco, não está seguro da duração da chamada estabilidade azul, uma referência aos capacetes das forças da ONU.
A distância de cerca de quatro mil quilómetros desde a entrada do Mediterrâneo até ao local da crise não traz tranquilidade pela distância, porque apenas alarga a área eventualmente afetada pela instabilidade. Depois, a hostilidade sempre pronta a explodir entre a Hezbollah e Israel, como aconteceu em 2006, sem que o aumento da presença das forças internacionais se reproduzisse na moderação dos conflitos de interesses e da força dos projetos de futuro.
As notícias, cautelosas mas consideradas respeitadoras dos factos, que as autoridades militares tornaram públicas vão no sentido de que o Líbano está de novo à beira do abismo, e que a situação da Síria e a atitude do Irão na área do equipamento militar, na qual vai apoiando as suas declarações de política internacional, não tornam crível o desarmamento da guerrilha.
As destruições, o número de vítimas combatentes e civis, que vão sendo somadas pela memória das populações envolvidas, não contribuem seguramente para um apaziguamento nas atitudes das populações: no Egito, o derrube de Mubarak, tal como aconteceu com a liquidação de Kadhafi, vai exigir reformulação das relações ocidentais com os novos governos de ideologia incerta; no Iraque, os EUA anunciam a retirada, mas é difícil rodeá-la de uma luminosidade de triunfo; no Iémen, a revolta popular levou cerca de um ano a derrotar o Governo; a Arábia Saudita esforça-se por apoiar os esforços da ONU.
Lembrando aos ocidentais o comentário de Sartre, no sentido de que a arma atómica deixava aos povos a decisão de continuarem a viver ou morrer, o líder do Irão, Mahmoud Ahmadinejad, desafia a comunidade internacional no estreito de Ormuz e desperta em Israel a tentação da intervenção preventiva para evitar o que imagina, com fundamento, ser a pior ameaça que tem de enfrentar.
O turbilhão em que se transformou o Mediterrâneo encontra os ocidentais, atingidos em parte significativa pela fronteira da pobreza, determinados aparentemente a manterem os seus conceitos estratégicos, mas ao mesmo tempo obrigados a exigir das suas forças armadas contenção nos gastos e eficácia nos resultados, com uma dificuldade visível de conciliar as duas exigências, mesmo apelando ao sentido de sacrifício e do dever.
A última exigência tem provas históricas de ser correspondida, mas a limitação dos recursos não assegura a eficiência que é o valor supremo do credo de mercado.
Fonte: Diário de Noticias
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