segunda-feira, 3 de setembro de 2012

O globalismo e o separatismo por Adriano Moreira


Diariamente os noticiários acumulam informações contraditórias sobre o destino da Europa, umas pressentindo um final de escombros, outras animando para a unidade solidária e com novo futuro, mas frequentemente como se a Europa fosse ainda o centro de um império euromundista, e um ou outro país supondo-se líder do sistema em crise.
É evidente que não podem excluir-se da narrativa da crise os erros de cada governo que se multiplicaram, mas também não ajuda a racionalizar o entendimento de situação esquecer que o globalismo foi um efeito sem projeto, e que o cisne negro que influenciou toda a evolução da decadência foi a última guerra mundial, tudo responsabilidade de europeus.
Logo no fim do conflito, que realmente haveria de continuar com o nome de Guerra Fria, não foi suficientemente compreendido e dito que a Europa não tinha abandonado, apenas por princípios, o que chamou, para legitimar a expansão colonial, "o fardo do homem branco", que era levar a civilização a todas as áreas culturais, mas sim que o abandonava por ter esgotado as suas capacidades.
As angustiantes discussões sobre o futuro dos povos europeus, de regra omitindo que o conceito mais rigoroso é o de povos ocidentais, andam sempre à volta de cálculos económicos, baseados nas reverenciadas mensagens das estatísticas, mas não parece que seja levada suficientemente em conta a realidade nova, que privou os ocidentais dos seus poderes, que não eram apenas científicos e técnicos, eram simples e maquiavelicamente políticos.
No fim da Segunda Guerra Mundial, os poderes ocidentais dominavam e governavam, no que tocava aos europeus, pelo menos a África, mais parte da Ásia, enquanto a Rússia e a América tinham impérios com algumas diferenças na maneira de agir. O império russo, então soviético, durou mais tempo formalmente, mas pela década de cinquenta já dava sinais de desagregação.
O predomínio político dos ocidentais, que começou nos séculos XV e XVI, com notável participação portuguesa, foi destroçado pelas suas guerras civis, por circunstâncias de que a sua própria governança interna foi pela maior parte responsável, sendo o mais evidente fator da sua derrocada o facto de os povos até então tratados, em geral, como mudos ou dispensáveis, colocarem um ponto final na tolerância.
Perderam não apenas o poder político, mas também o domínio das matérias-primas, das energias não renováveis, dos mercados dos produtos acabados, que tinham sido objeto animador das decisões expansionistas do fim do século XIX.
O grande facto foi que os povos da Ásia e da África, que viveram o descalabro ocidental do século XX, não admitiriam continuar a viver sob domínio exterior. O desastre da Indochina, a inutilidade custosa da Argélia, a retirada portuguesa, demonstraram-lhes que os intitulados vencedores da guerra mundial guardavam a memória do prestígio, mas não adquiriram a nova perceção da realidade.
A ideia, talvez sobretudo americana, de que a superioridade técnica e científica, do saber e do saber fazer, poderia assegurar uma supremacia de novos moldes deveria tomar em conta que o complexo militar-industrial, que Eisenhower não conseguiu dominar, espalharia pelo mundo os seus instrumentos de exercício, que a difusão do saber e do saber fazer não pode ser impedida, e que o peso de manter as supremacias políticas passou a ser visto pelas novas gerações segundo um conceito que se divulgou: "No longer an honour for sons to die." A própria unidade política interna dos ocidentais foi posta em risco, como na Espanha, na Inglaterra, na Bélgica, na Itália, e assim por diante, o que inclui as fragilidades da unidade europeia.
Que a ideia da supremacia não perdeu vigência é evidente, mas o facto é que os ocidentais passaram a ter que evoluir na sua nova circunstância e dependência. E para enfrentar esta nova situação não são os separatismos e as arrogâncias os mais indicados pressupostos para uma nova ordem, incluindo a paz, e a segurança humana. Porque as imaginadas superioridades definitivamente não prognosticam vencedores e vencidos, mas apenas desastres globais.

Fonte: Diário de Noticias

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